Cresce o número de trabalho escravo no Brasil (Foto: Divulgação)
Recentemente a multinacional Cargill foi condenada pela Justiça do Trabalho, em primeira instância, por práticas de trabalho infantil e análogo à escravidão em plantações de cacau de seus fornecedores no Brasil. A empresa ainda pode recorrer da decisão. A condenação é resultado de uma Ação Civil Pública movida pelo Ministério Público do Trabalho. O órgão cobra a responsabilização de toda a cadeia produtiva, incluindo as indústrias que compram insumos de produtores rurais autuados por irregularidades. Nos últimos anos tem crescido o número de denúncias de trabalho escravo. Segundo informações do Ministério do Trabalho e Emprego, o Brasil encontrou 2.575 pessoas em situação análoga à de escravos só em 2022.
Para a advogada trabalhista empresarial Fernanda Prado, o combate ao trabalho escravo é crucial em todas as esferas, desde a cadeia de suprimentos: “Rastrear isso é uma estratégia importante para inibir práticas de trabalho escravo e/ou infantil, devendo, as empresas, realizar auditorias e inspeções de seus fornecedores de modo a assegurar que nenhuma delas esteja explorando esse tipo de mão de obra e disponibilizar um canal de comunicação e denúncias pode ser um excelente mecanismo de controle”, aponta.
Uma empresa que se envolve em situações deste tipo, pode enfrentar grandes consequências judiciais. “Ao ser constatada pelos auditores fiscais a utilização de mão de obra análoga a de escravo e trabalho infantil, a empresa poderá receber multas ou até mesmo ter as operações interrompidas e de quebra integrar a lista suja. Além da imagem negativa perante os investidores e a sociedade, ela deixará de ter acesso a financiamentos em bancos públicos, que assinaram o Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo. Bancos privados também podem consultar a lista e utilizá-la como critério para liberação de crédito”, explica a doutora Fernanda.
Sobre os direitos das vítimas: “Elas possuem direito ao recebimento dos salários que não foram pagos e também do valor devido pelo encerramento do contrato de trabalho, regularização do seu contrato de trabalho, recolhimento do FGTS, anotação na carteira de trabalho, recebimento do seguro-desemprego pelo período de até três meses e regularização migratória, caso o trabalhador seja imigrante, não tenha documentos e queira permanecer no Brasil, além de proteção em caso de risco de vida”, conta a advogada.
Fernanda ainda alerta que: “As empresas sempre devem seguir as leis trabalhistas, uma vez que se trata de direitos irrenunciáveis, bem como as normas que regulamentam a saúde, segurança e o bem-estar dos trabalhadores, que se descumpridas poderão culminar em sanções pesadas por parte dos entes fiscalizadores”, finaliza a advogada.
O IMPACTO EMOCIONAL DAS VÍTIMAS
Recomeçar nem sempre é fácil, menos ainda para quem é vítima de trabalho escravo. Para a Psicóloga e Logoterapeuta Michele Silveira, terapia é essencial para o auxílio psicológico destas pessoas. “As vítimas de trabalho escravo não têm muitas oportunidades para desenvolver as suas habilidades sociais e comunicativas por viverem com receio. Elas temem se relacionar com pessoas fora do seu convívio social e viver novas experiências, podendo se tornar indivíduos submissos. Por outro lado, também podem se tornar adultos raivosos por temerem reviver as vivências ruins do passado para evitar que se tornem adultos disfuncionais e deixem de aproveitar a vida, crianças e adolescentes que passam por isso, por exemplo, devem recorrer à terapia. Todos que sofreram esse tipo de trauma devem buscar tratamento psicológico para ressignificar os mecanismos de defesa aprendidos quando mais jovens”, orienta.
Viver em condições de exploração causa inúmeros traumas às vítimas. “Eles aparecem como uma resposta emocional após experiências perturbadoras que removem a sensação de segurança de um indivíduo. Quando uma pessoa vivencia um período ou um evento traumático, seu cérebro é ativado de maneira intensa e imediata, desencadeando uma série de respostas físicas e emocionais. Essas respostas são uma tentativa do cérebro de proteger o indivíduo e garantir sua sobrevivência. O trabalho análogo a escravidão deixa o indivíduo vulnerável, isolado ou sobrecarregado, mesmo que não envolva dano físico”, aponta Michele.
O caminho mais indicado é buscar todo o apoio possível para seguir adiante. “A terapia ajuda vítimas de trabalho escravo de diversas formas, especialmente as que apresentam sintomas acentuados de depressão. Ela ajudará esses indivíduos a construírem sua autoconfiança, desenvolver suas habilidades sociais, ensinar a perdoar e a lembrar dos fatos e não doer mais”, conclui a Psicóloga.